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quarta-feira, 2 de maio de 2012

Um sonho despedaçado e o despertar para o presente

Lembro-me até hoje das tardes que passei imaginando como seria a grande civilização egípcia. Tinha um grande sonho de menina de conhecer o Egito, entender seus faraós, descobrir seus deuses, desfrutar de suas pirâmides e mergulhar nos grandes mistérios ainda pouco desvendados dessa civilização que encantou o mundo.

Mas além do sonho, algo além me chamava até aqui. Uma força magnética, mística, uma vida passada quem sabe, ou o próprio mistério de um sonho para mim inexplicável e desconhecido. E quando descobri que meu nome tinha origem nessa região, as asas da minha imaginação cresceram e voaram mais longe.

Já não sei distinguir se era sonho ou ilusão, porque a aura dos mistérios Egípcios cativaram minha imaginação, assim como o meu coração em busca por aventuras nos desconhecidos mistérios da alma de uma civilização há muito perdida e jamais esquecida, em busca por algo místico, por entender os mistérios da alma humana, descobrir nosso passado e revelar nossas origens. Hoje vejo que vim busca de mim mesma, da minha história, da descoberta de quem eu sou e de quem eu fui.

Uau, essa é uma grande responsabilidade para um país tão pequeno em tão pouco tempo que vim passar aqui. Parte consciente, parte inconsciente eu estava cheia de expectativas, que como sabiamente diz meu grande professor Humberto Maturana, não se cumprem.

Chegamos ao Cairo num sábado a tarde, uma sensação esquisita pairou sobre mim, como se nada que estivesse vivendo fosse real, aquela sensação de que estamos sonhando acordados, como se ao pisar aqui, entrasse no meu sonho de menina.

O aeroporto estava vazio, uma calma que parecia irreal para um país que basicamente sobrevive do turismo. Algo estranho no ar ou no meu olhar? Talvez no encontro entre o meu olhar e o ar que paira no Cairo nesse momento de sua história.

Os dias passaram e nós fomos conhecer o que restou dessa grande civilização, imagens desenhadas, textos escritos, jóias, múmias, estátuas e construções magníficas em lugares repletos de história e beleza. Lugares onde a areia do deserto se eleva em construções perfeitamente desenhadas, onde o silêncio do deserto e o mistério do passado permanecem de mãos dadas no sopro do vento, uma história já há muito perdida pela desconstrução do próprio tempo ou pela intervenção humana. O silêncio do tempo quebrado por muitas de pessoas te perseguindo em busca de alguns trocados.

Os trocados roubados das formas menos nobres possíveis, mentiras e manipulações com o objetivo de te desviar do seu percurso para o percurso onde alguém ganha uma comissão com isso "o múseo está fechado, não quer conhecer o múseo de papyro (vulgo loja)", "o parque das pirâmides é muito grande vocês precisam fazer a camelo", guardas que deveriam te proteger pedindo dinheiro em todos os lugares, inclusive para entrar em lugares públicos, chegando até ao cúmulo de me trancarem num banheiro para ganhar uns trocados em retorno. Desespero ou mau caráter?

Realmente não consegui entender se está assim pela baixa no turismo ou se é assim, mas pelo que o livro que estamos lendo e as pessoas falam, é assim e sempre foi.

Definitivamente minha experiência como turista no Cairo foi uma decepção. Me senti bastante usada e no fim já não consegui mais confiar em ninguém que tivesse algum interesse monetário na relação com a gente. Não demorou muito para eu descobrir que minhas fantasias de conhecer a civilização egípcia não passavam de uma ilusão de menina.

Essa ilusão do sagrado e do místico na verdade só existe hoje na imaginação e no olhar das pessoas que visitam aqui. A civilização alcançou grandes feitos, muitos deles até hoje permanecem um mistério, mas eles eram uma civilização como outra qualquer, com suas conquistas e seus desafios, com uma grande idolatria centralizada na figura do Faraó, para onde a maior parte da energia e do trabalho do povo era canalizado. Um povo que expressou a grandeza de suas descobertas em construções magestosas, que inventou a escrita para registrá-las e que gostava tanto da vida que se tornou obsecado na preparação de seus mortos para a vida eterna. E por tudo isso, seus feitos venceram o tempo e nos trouxeram um pouco de como era a vida na primeira grande civilização desse planeta.

Mas hoje para o Egito seu glorioso passado é um motivo de orgulho e sua maior fonte de renda, nada mais pelo que vivi aqui. A tristeza tomou conta de mim, algo morria, talvez a maior de todas as ilusões que eu tinha, uma idealização de um passado onde tudo era perfeito, um passado que pudesse trazer soluções e conhecimentos para o futuro, um passado que pudesse me ajudar a descobrir quem sou.

Quando minha ilusão morreu pude ver o presente e realmente entender na pele que o passado já não é, é apenas o que carregamos dele no presente, e o futuro também ainda não é, é apenas o que carregamos dele no presente. Me sinto mais leve, já não preciso descobrir quem fui e consegui me despir das expectativas de quem serei, posso simplesmente ser, e o que realmente importa é quem eu sou e como eu vivo hoje.

É libertador quando descobrimos nossas ilusões e mais ainda quando podemos deixá-las ir, mas a experiência nem sempre é fácil, pois as vezes estamos tão identificados com algumas ilusões que elas passam a fazer parte da nossa carne e de quem achamos que somos. Disse adeus para o Egito da minha imaginação e boas vindas ao Egito como ele é, e aí pude desfrutar.

 

Despertando a cada dia,

Narjara


 

2 comentários:

  1. Narjara, parabéns pelo Blog! Está lindo e eu também tenho viajado e crescido com suas experiências. Um beijo. Mônica.

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  2. Oi Mônica, obrigada! Tem sido um prazer compartilhar e receber os feed-backs é muito gostoso. Um grande beijo, Narjara

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